quinta-feira, 27 de março de 2008

uma combinação.

odisseu. para onde evoluímos?

tirésias. para ver o futuro, deve-se olhar para o passado. ainda que sejam idos em parte imaginários. o próprio presente e o futuro falam, também, por meio de parábolas mais ou menos conectadas e empreendidas por aqueles que lhos dão voz. sintetizam-se todos numa assíntota (em sua classe, tendem ao infinito) formada por pontos (encruzilhadas) determinados por variáveis padrões de iteração produzidos na imaginação. nas mentes que apontam, colhem, contrapõem referências, pressupõem materialidade. o futuro, de sua perspectiva projetada, é sempre necessário.

odisseu.
vejo as ondas, no mar, como trilhos. descrevem arcos que sustentam os caminhos por onde posso navegar. não posso seguir cada um com os olhos ao mesmo tempo, nem guiar a embarcação por todos. tenho dormido, tirésias, com o olho direito aberto. a cada clarão, posso vislumbrar partes de jornadas semelhantes, conduzidas por vagas análogas.

tirésias. as analogias, odisseu, disse-me bem, fundam-se em comum substrato, ao mesmo tempo em que fundem-se em outras vagas, trilhos, por sua vez. não são referências senão sentidos, não são juízos senão poética.

odisseu. assim que, por vezes, vejo adiante da névoa, em alta definição, algo de tão pristino que escuto a própria flauta de pã. me estremeço, minha anatomia toda solta, lançada no ataque mais belo ao próprio cerne. ali está a embarcação feita de superfícies e submundos, em seu equilíbrio de luz e sombra, radiante cinza.

tirésias. e assim há de ser, diz-me a deusa.

odisseu. não obstante, devo dizer, se, não entregue a morfeu, ponho-me em posição de escrutínio, seguro o leme com toda vitalidade, coisa bem diversa se me assoma. um naufrágio, chegado à costa, já abandonado pelos sobreviventes. talvez tenha-se chocado contra mais potente encouraçado. me enleva a visão, no entanto, tirésias. ali onde outrora se procurava a terra prometida (a própria casa), meio à desmaterialização em processo, vibravam ninhos de pássaros cantadores, musgo de um verde somente sonhado, líquens de todas as cores e poças de água do mar refletindo o céu, prateando o cenário.

tirésias. e assim há de ser, diz-me a deusa.

odisseu. valham-me, então, os deuses, por haver aprendido a apreciar a música de pã, e não me afligir com contrariedades senão com contradições. vejo, em meus próprios augúrios, belas noções. não temo, tirésias, tendo fitado o infinito nos entremeios do mar imenso, os deuses que, de tão distantes, podem apenas valer-me, porém não me tocam a pele. fiz-me filho de narrativas que eu mesmo empreendi, companheiro de que senão a beleza que aceito e traduzo, sol após sol, em revoluções ciclicamente apresentadas, em aparições gloriosamente pequenas, presenças robustas.

coro. somos, agora, necessariamente, tanto odisseu quanto tirésias, um nos cabelos do outro, nos espaços e além. estamos onde quebra a onda que vem desenrolando-se nos trilhos de ventos penetrantes, não soprados porém sussurrados. não somos nem tampouco odisseu ou tirésias, nem perguntas ou respostas, nem mesmo fomos sintetizados senão somos as próprias ondas e os trilhos em seu propósito de conduzir. as reverberações possíveis de uma combinação precisa e única de atrito e momentum. tendendo ao infinito.

Um comentário:

Anônimo disse...

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