terça-feira, 8 de dezembro de 2009

sináptica

hoje estou assim, quase, quase túrgida, como costumava dizer. não foi o suficiente fazer meu diário depoimento em outras paragens, por isso este regresso.
ainda não sei se mantenho esta arena das arengas ou se migro completamente para lá. mas não interessa.
o que esteve retumbando o dia todo foi o pensamento de que sempre busco o mais real do que o real. não é o caso de se iludir exatamente: não é um panteão ao qual professo fé eterna e que se abala com deslocamentos morais. não é esse tipo de escapismo. aliás, embora essa palavra seja bonita, detesto-a. escapar do que, problemas? agruras de trânsito, vaidades, dinheiros, merecimentos, prazos e dores? talvez. em parte. mas esse pacote sinistro não é a definição do real (se liga). não se busca deslumbramento para fugir somente, como se essa fosse a única razão pela qual se imagina qualquer coisa. até porque tenho a desconfiança de que o mais do que real não é só uma questão de imaginação. é quase um desenvolvimento de outros sentidos. ou somente tomada de conhecimento deles, momento a momento. o sentido da força: calibra pesos e velocidades. o sentido da permeabilidade: capaz de ser impresso por refrescâncias e outras temperaturas, ligado à maleabilidade. o sentido circadiano: registrando ritmos e pulsos incessantemente.
o que é, então, essa inconstância aparente, insaciabilidade, essa vontade tão voraz que receio até que irrite aos que a testemunham? sintomas de uma existência mais do que real. de constância na estimulação de sentidos. de constância, sim, nos impulsos exploratórios. de busca também de pontos de apoio mais do que reais, pontos de apoio não exatamente fixos mas que se movem de acordo. busca de cadência. uma tarefa solitária, em parte. mas inexorável.

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

dores de crescimento

sou tão distraída hoje em dia. será que maturidade é, na verdade, concentração? às vezes digo umas coisas sem pé nem cabeça ou tenho opiniões equivocadas porque ignorei algumas variáveis importantes completamente, ou por ansiedade. ou será que inteligência é concentração? atenção é muito importante. perceptividade (pensei nisso no fim de semana). sou perceptiva para algumas coisas e outras me são quase invisíveis. na verdade, hoje acho que não percebo quase mais nada, vivo num equivalente menos infantil do mundo da lua. quando dizem que uma criança vive lá, é porque se esquece de escovar os dentes, tropeça nas coisas, não ouve o que a mãe diz. ou seja, ligo a expressão a essas reprimendas de adulto; umas razoáveis, outras não.
e hoje vivo no mundo w', digamos assim. é o mundo atual, com o mesmo repertório, porém a mobília está numa fase meio autista. analogias forçadinhas à parte, o irônico é que durante brincadeiras resgatadas da infância ou conversas sobre os modos da outrora escatológica pequena pessoa que fui me sinto menos distraída, menos nesse "mundo da lua" em que enfiam as crianças. elas estão ligadas, sim. muito enraizadas. lidam com as coisas assim que elas aparecem, mesmo que às vezes de maneira alegórica. nós adultos indulgentes sempre deixamos as coisas pra depois e lidamos com seus fantasmas. argh.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

voltou

não acho bobagem pensar que as coisas pedem um retorno. o fim da música é mais tranquilo quando volta para a tônica. pode ser bonito de outro jeito também. mas existe mesmo essa vontade de resolução pelo resgate.
a memória; nunca mais a subestimo. acho que mais de um ano se foi vivendo no presente. estou saboreando este momento de distorcer a conotação sempre positiva dessa expressão. viver no presente é a mentira mais idiota de que consigo me lembrar agora. parece tão infantil. sem a memória, como desfrutar de qualquer coisa? como sentir que se gosta de algo sem trazer um aprendizado dos sentidos?
recapitular e poder sorrir sozinha de conclusões e fazer ligações entre aquilo lá longe e essa coisa agora que poderia passar despercebida não fosse a memória.
engraçado, nunca gostei daquele quadro do dali, persistência da memória ou do tempo, ou o que o valha, mas bem, acho que tivemos um momento parecido.
sem ela, como eu iria olhar por esta janela aqui ao meu lado/minha frente e ter tanta riqueza de sensações e tanta profusão de palavras se acotovelando? não interessa agora se são bem encadeadas. nem escolhidas. sempre posso voltar e corrigir, se achar que devo. vou lembrar dos critérios, a partir deles talvez escolher novos. poderia descartar esta janela, desmerecer coisas e pessoas, a começar por mim. e é assim que as coisas se estavam encaminhando, de maneira sórdida e silenciosa ao mundo, incrivelmente alta à cabeça sempre quente, estragando travesseiros uma noite depois da outra, sem olhar lá pra fora, desperdiçando.
mas tem muito tempo ainda, e ele persiste. muito o que fazer.
e cada vez menos vergonhas. no plural, muitas e diferentes que eram.
depois de uma pausa, pensei agora que – de fato – vários posts aqui no blog de uma maneira ou de outra se relacionam à memória. e acredito (não fui verificar) que são positivos. aliás, francamente, essa é um característica que aprecio: escrever e se inspirar nos momentos bons. não necessariamente felizes, dá até preguiça de pensar o que é isso de fato, por isso digo "bons"; os momentos de descoberta (ou nada mais que resgate, ave sócrates), de retorno mesmo.
saturno, saturno. vou fingir que você é a lua só um pouquinho. pra poder olhar contemplando, um pouco teatral, algo como uma cerimônia, um ritual ingênuo, como os de adolescente.
mas no início, antes de largar este post, queria escrever um sobre a palavra 'yield'... acho que deu certo.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

ranting & raving

às vezes gosto de pensar que não sinto raiva facilmente. mas isso é auto-engano. exemplo: basta que alguém seja condescendente comigo ou outra mulher por causa da aparência ou de estereótipos para que me fervam os nervos.
não é engraçado: já duas vezes em matérias do mestrado os professores me olharam confusos no primeiro dia de aula e vieram perguntar se eu era aluna do mestrado em filosofia (leia-se: você está na sala certa?)... posso estar exagerando, mas uma pulga atrás da orelha direita me convenceu maliciosamente de que os professores em questão não só ficaram desconfiados pois suas classes eram masculinas demais para ter uma aluna como também pelo fato de que não sigo o estereótipo da mulher intelectual.
e como ele se caracteriza? bom, em linhas gerais, dá pra perceber que há um acordo tácito segundo o qual mulheres inteligentes não se preocupam com a aparência. daí deriva o resto: nada de maquiagem, nada de usar lentes (só óculos são dignos), nada de salto, nada de roupas e bolsas caras. para maiores angústias quanto à baixa cotação da moda no mundo intelectual, clique aqui.
o caso é que possivelmente fico muito incomodada também por já ter tido esse preconceito, em alguma medida. que vergonha.

por outro lado, tudo isso, raiva ou não, provocou um rearranjo na minha auto-imagem. o que, noves fora, significa mais ou menos o seguinte: faço mestrado em filô do mesmo jeito que o zé pratica canoagem ou a mariazinha processa dados: é um trabalho. tem técnica. tenho gosto por ele, mas não quero que me defina sozinho. tem outros aspectos da vida que considero e sinto que são tão relevantes quanto esse: afeto pela minha família e amigos, senso estético, paladar, senso de humor, impulsos, razões, estratégias... enfim. deu pra ter uma idéia, acho.

e o mesmo vale para outras pessoas.

e assim admiti que tenho um pouco de preguiça de intelectualidade segundo o grande livro dos estereótipos. e assim me desobriguei totalmente de cultivar certas coisas que não me instigam tanto assim mas que são consideradas obrigatórias pelos corredores da unb. e agora só preciso me convencer 100% de que estou certa, pois toda essa estória está me atrapalhando os estudos.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

astronomy domine... anima mea

retorno de saturno. aparentemente, estou nele.
não sei bem o que acho de astrologia, mas "retorno de saturno" soa. combina com "retumbante". soturno. estorno. saturo. estouro. noturno. ressalto. costuro.
então se for verdade que umas constelações me estão pirando os nervos, podem ser de estrelas ou palavras em forma de som.
estive hoje comentando: o que tem gosto bom não tem nome feio: camomila, erva-doce, sálvia, alecrim... mas o que tem gosto ruim, sim: boldo, carqueja, mastruz, cáscara...
então não se elimina o acaso. acredito muito na sinestesia. mais do que nos astros.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

saudade daquele radical ermo contemplativo da infância

que criança séria que eu era. mas ainda bem. por isso, olhava com força.
e assim até hoje guardo uns vislumbres de como era minha cidade naquela época. minha brasília tão aberta que causaria ansiedade nos mais citadinos.

sempre lamento pelos cantos toda mudança que o plano piloto sofreu. posso enumerar algumas pragas:

* os jardins à la teletubbies que proliferam em canteiros, balões e superquadras;
* as infames lajotas que deixam tudo com cara de banheiro do avesso e, como não bastasse, caem na cabeça das pessoas que ainda se atrevem a andar a pé pelas quadras;
* os prédios muito grandes na zona central, bloquando a vista dos monumentos do eixo que, afinal, chama-se monumental;
* as cercas em todo lugar, prisões disfarçadas: em volta de pilotis (crime! safadeza!) impedindo a livre circulação tão almejada por lucio costa, em volta de parquinhos infantis, de árvores etc;
* a proibição de uso do pilotis para qualquer coisa que não seja caminhar do estacionamento à portaria. crianças deveriam brincar nele, afinal;
* tamanhos inaceitáveis de letreiros, além do mau-gosto;
* falta de manutenção na torre e no parque da cidade, também em prédios sob responsabilidade do governo (federal ou distrital): os da unb, da escola de música, das escolas classe e parque, espaço cultural da 508 e por aí vai;
* quaisquer reformas nos prédios que tirem o caráter arquitetônico inicial. por que não apenas lixar e encerar o concreto, cuidar das pastilhas...? filisteus!

felizmente, para minha sanidade e conforto, a cidade e minha memória em conjunto conseguem produzir sensações que remetem ao passado saudoso. não são exclusivamente visuais, mas momentos sinestésicos, varrendo a abrangência de sentidos que um dia vivenciaram com incrível consciência as cores, relances, climas, razões, texturas e caminhos de brasília.

os gatilhos variam; tenho a impressão de que frequentemente são nuances de luz sobre prédios e árvores, sobre o lago. ou este céu inevitável, indefectível e maravilhoso. o concreto, algum vestígio de paisagismo setentista, um pouco de athos, marcílio, lelé, lucio. pau-ferro no eixão sul e os comparsas ipês e sibipirunas. algumas espatódias e callistemon, embora exóticas. pequenos trechos de curvas e jardins e até pedaços de asfalto sem novos desvios. praça portugal. praça do conjunto, um pouco. dependendo da hora do dia.

se no futuro esse meu contentamento com a miséria de lembranças que tenho acabar, ou se todo vestígio da minha brasília sumir, vou-me embora daqui, só não sei pra onde.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

a volta dos que não foram

mangas arregaçadas, ponho-me depois de tanto tempo novamente a dar palpites. pensei nisso o dia todo, embora as palavras futuras não tenham me dado o ar de sua graça, aquela prévia que antes sempre tinha em pedaços quando saía nas minhas caminhadas. mas a sensação de que poderia tentar de novo. quem me conhece, já captou: é aquela época do ano. o inverninho de brasília, antes de secar até o osso.

neste dia tudo começou com a primeira caminhada depois da mudança de endereço, aqui pela vizinhança. me segurando agora para não adjetivar o conhecer passo a passo dessa nova empreitada. uma trajetória já tão familiar de carro, mas tão estranha e sedutora pé ante pé: nova para os sentidos de crivo fino. (foram poucos adjetivos). já são nove meses: só contei agora, de introversão emparedada (de gesso, infelizmente), a vida na torre que, efeitos deletérios descontados, dá justo contraste para o descortinar inevitavelmente junino.

por isso tudo me perdoem qualquer afetação, quaisquer palavras cheias de si, ou uns ares de empoamento. é só para garantir a diversão (minha). saudade.

ficha técnica:
caminhada do dia: 8h, pela QI/QL 1 do lago norte.
ouvindo durante: teaser and the firecat, cat stevens
ouvindo ao escrever: gnossiennes 1, 2 e 3, erik satie (roland pöntinen)
ouvindo agora: gymnopèdies 1, idem acima
esqueci de falar sobre: voltar a ouvir música. sim, voltar a ouvir música. ah, e sobre a luz.